27 nov RICARDO KELMER
Ricardo Kelmer

Nome: Ricardo Kelmer
Biografia:
RICARDO KELMER – Nasceu em Fortaleza, em 1964. É escritor, roteirista e letrista musical. É autor, entre outros livros, de Pensão das Crônicas Dadivosas (crônicas), O Irresistível Charme da Insanidade (romance) e Guia de Sobrevivência para o Fim dos Tempos (contos). Organiza eventos de inserção da literatura na agenda de entretenimento da cidade, como o Anoitecer de Autógrafos e o Bordel Poesia. De 2012 a 2016 apresentou-se, com o parceiro Felipe Breier, em várias cidades brasileiras e em Portugal com o espetáculo Vinicius Show de Moraes, de sua autoria. Organizou em 2016 o livro Para Belchior com Amor, reunindo catorze autores cearenses que escreveram contos, crônicas e cartas inspirados em canções de Belchior. É um dos diretores do bloco carnavalesco Simpatizo Fácil. Site pessoal: blogdokelmer.com
Poesias
O TEMPO DO HORROR
Vestidos de patriotismo
Seguindo seu deus vingativo
Eles rastejam dos escuros porões
Onde escondiam os ódios e preconceitos
E nos atacam
Por pensarmos diferente
Atiçados pelo odor de morte
Que a boca de seu messias exala
Eles hasteiam suásticas
E armam as crianças
E nos torturam, e nos executam
Em nome da família brasileira
Eu queria que fosse um pesadelo
Mas é real…
Ouçam as salvas de canhões:
O horror é um tempo que se anuncia
Sem flores nem poesia
Banhado em nosso sangue
No horizonte do Brasil
QUANDOS
Hoje me dei por mim ontem
Um velho quando de mim que eu já não lembrava
Quando o eu que hoje sou ainda não era
E quem eu era não se via a si
Como o eu de hoje bem o vê
Aquele que eu era, nobre e sonhador
Tão juvenil de inocências
Em que vis quandos se perdera?
Que fiz eu dele para que hoje não seja?
Terei-o assustado com medonhos vislumbres
Desse outro em que me tornei?
Portais do tempo, abram-se por um segundo
Que saltarei até o quando em que fui aquele eu
E lá, com ternura me abraçarei
E me farei olhar bem para mim
Para guardar a quem eu ainda era
Para que hoje, ao espelho
Eu possa jamais esquecer
No resignado eu que me olha
Esse quando que um dia eu fui tão mais eu de ser
O GOZO DA LÍNGUA
Pela maciez sonora dos fonemas
De formas acetinadas
Que a língua deslize
As arestas silábicas
Que a pronúncia obstaculizam
A língua sensibilize
E no subentende-se das reticências
Onde a linguagem se insinua
Que a língua dance nua
E mexa-se, revire-se, contorça-se
Lambendo-se ao prazer do ritmo
E no sabor do som deleitoso
Salive de gozo em êxtase linguístico
Ao silenciar dos versos que findam
Que descanse a língua de sua lida
E, enfim, adormeça, desmaiada e lânguida
Desmilinguida
ELA NO ESPELHO
No espelho ela se olha
De um outro tempo ela se vê
E no reflexo a que se olha
Não é quem pensa ser
Ela vê que ainda é
Aquela que um dia não se foi
Uma não se reconhece
A outra espera no depois
Elas se olham e se escondem
E se perguntam outra vez
Mas o espelho não responde
Ao olhar dos seus porquês
Quem é a aquela que se olha?
Quem olha a outra e não se vê?
E o seu olhar só lhe devolve
O mistério de crescer